Celso Damadi

O executivo que almeja uma carreira de sucesso não deve se limitar às habilidades técnicas.

O executivo que almeja uma carreira de sucesso não deve limitar-se às habilidades técnicas

Por Fabiana Monteiro

Na coluna desta semana, conheça a história deCelso Damadi – Vice-Presidente Financeiro/Investimento na Porto Seguro

Do futebol à Controladoria

Nasci na zona norte de São Paulo, periferia da cidade. Meus pais, recém-chegados do interior do estado, haviam crescido e casado em Ourinhos-SP.  Sou o mais novo de uma família de 5 irmãos, cujo pai era analfabeto e mãe estudou somente até a quinta série. Apesar dessa simplicidade, meus pais sempre nos incentivaram aos estudos que decorreram durante toda minha trajetória estudantil em escolas públicas, encerrando-se no Colégio Técnico Estadual em que cursei Administração. Somente em 1989, tive contato pela primeira vez com uma instituição de ensino privado, ocasião em que iniciei Ciências Contábeis na faculdade Mackenzie, depois fiz Pós-graduação em Controladoria e MBA de Gestão Empresarial, ambas na Fundação Getúlio Vargas.

Mas meu sonho de garoto sempre foi ser jogador de futebol, algo que eu “achava” que fazia muito bem, por sinal. Por volta dos 14 anos, quando eu estava prestes a assinar um contrato juvenil, minha mãe interveio e conseguiu para mim um emprego como office boy na empresa em que era copeira. Por ter muita facilidade com números/finanças, depois de apenas um ano no emprego, passei de office boy para analista de contabilidade, atuando na linha de frente, executando todo tipo de rotina contábil.

Hoje, percebo que desistir do sonho de ser jogador de futebol foi uma decisão acertada, da minha mãe (risos). Ao iniciar ainda muito jovem em uma carreira profissional, já com carteira assinada, tive a oportunidade de, desde muito cedo, vislumbrar com clareza os meus objetivos profissionais. E apenas 4 anos após iniciar em meu primeiro emprego, consegui ingressar em uma grande empresa, a Coteminas.

A Coteminas é uma empresa muito moderna, e há 30 anos já trazia o conceito de controladoria e de auditoria para a área contábil, algo ainda novo no Brasil e que foi implementado por Josué Gomes da Silva, filho do fundador da Coteminas, José Alencar. Lá, tive a oportunidade de compor a primeira equipe de Controladoria da empresa, e pude compreender a importância estratégica desta área na tomada de decisões da empresa. Nesta ocasião, eu me reportava diretamente à Roberto Cristofanilli, um homem muito inteligente e que me inspirou muito. Ele era o que chamamos, hoje, de Controller, mas na época ele tinha o cargo de diretor financeiro, e tinha feito carreira como auditor. Inspirado em sua trajetória, escolhi seguir essa carreira, fiz, então, aos 21 anos, testes para entrar como trainee na área de auditoria da Deloitte.

Considero este o mais importante Turn Point da minha carreira, já que recebi como contraproposta da Coteminas para assumir a coordenação do departamento, e assim permanecer na empresa. Eu era muito novo, muito curioso, aliás, algo que sou até hoje, e isso foi reconhecido por eles ao oferecerem para alguém tão jovem, como eu, um cargo de liderança. A proposta financeira era muito interessante, algo em torno de 8 vezes mais que eu ganhava como trainee na Deloitte. Mas eu declinei da oferta, visto que naquele momento, meu foco profissional estava em ganhar conhecimento, assim questões financeiras estavam em um segundo plano. Na ocasião, minha família, principalmente minha mãe, questionou minha decisão e até mesmo o Roberto se surpreendeu com minha negativa, mas, depois me apoio totalmente.

Mas ao declinar da oferta da Coteminas, minha carreira pegou tração. Com 5 anos de Deloitte eu já tinha sido promovido a gerente. Minha ascensão se deu desta forma, porque entrei como trainee, mas trazia comigo uma “bagagem” de 7 anos trabalhando na área. Então, em comparação com meus colegas trainees que estavam iniciando suas carreiras naquele momento, eu tinha um conhecimento prático muito maior. Para muitos deles aquele era o primeiro emprego, o que era normal, já que o caminho mais comum é primeiro a construção de uma vida acadêmica para depois ingressar no mercado de trabalho. Mas meu caminho foi inverso. Fato curioso é que, por ter tido todas as promoções duplicadas, com 4 anos de empresa eu já estava dando treinamento para o pessoal da turma de trainees que ingressou comigo.

Entrar na Deloitte exigiu muito de mim, trabalhei demais, estudei e convivi com pessoas inteligentíssimas. Entrei em um grupo que me “jogava pra cima”. Eu era o único do processo seletivo de trainees que tinha estudado em escola pública, que não tinha inglês fluente e que morava na periferia da cidade. Todos os dias eu chegava em casa, após o processo seletivo, e chorava com minha mãe. Eu tinha a insegurança de achar que uma pessoa vinda de onde eu vim jamais entraria numa empresa daquele porte. Minha mãe, em sua sabedoria, dava esperança e me apoiava muito. Entrar na Deloitte foi, então, uma vitória principalmente psicológica, que mudou a minha vida. Mas os desafios não abrandaram após a conquista da vaga, passei a trabalhar mais que a maioria, de 12 a 14 horas por dia, para provar para mim mesmo que eu estava “à altura” do cargo e da Empresa, e pari passu com meus colegas.

Foi na Deloitte que iniciei minha jornada na área de Auditoria Externa, em que tive a oportunidade de trabalhar com profissionais extremamente qualificados, treinados e acima de tudo, conectados com os negócios dos clientes. Aprendi muito nos anos decorridos, principalmente a importância de cultivar relacionamentos e de ter adaptabilidade para lidar com equipes e com pessoas completamente diferentes. Obtive muito reconhecimento, fui convidado para trabalhar com quase todos os clientes que auditei até que, uma das propostas, a da Medial Saúde S.A., cativou-me. Essa proposta vinha justamente ao encontro do sonho que me fez ingressar na Deloitte, o sonho de ser Controller, inspirado lá atrás por Roberto Cristofanilli. Eu queria uma posição em que eu pudesse contribuir estrategicamente para a empresa, queria estar no centro das tomadas de decisão e, principalmente, auxiliar outros profissionais a crescerem. Senti que era hora de “dar o próximo passo”, então, logo após meu casamento, em 2002, aceitei o convite do João Afonso para ocupar a diretoria financeira da Medial.

Minha contribuição na Medial foi curta, porém robusta, consegui reestruturar as áreas de Controladoria, de Impostos e Comissões, além de criar a área de Auditoria Interna que na época ainda não existia, foi uma experiência muito rica. Fiquei menos de 3 anos na empresa, porque, logo recebi uma proposta interessantíssima da Porto Seguro.

A Porto estava abrindo capital, e precisava profissionalizar toda a sua equipe, por isso, fui abordado por um Headhunter, e aceitei o convite para participar do processo seletivo para o cargo de Gerente de Contabilidade e de Controladoria.

Trabalho todos os dias como se fosse o primeiro!

Durante o processo seletivo para ingressar na Porto passei por uma entrevista com Jayme Garfinkel, então, presidente do Conselho. Essa entrevista me marcou profundamente, construí, a partir de então, uma relação muito próxima com Jayme e tenho por ele, até hoje, muito carinho e admiração.

Assim como aconteceu anos antes na Coteminas, a Medial S.A. me ofereceu o cargo de diretor adjunto para que eu não saísse da empresa, mas declinei. Novamente, tomei esta decisão baseada na construção de uma carreira em longo prazo. Vim para Porto Seguro para um cargo inferior ao cargo que me ofereceram na Medial, porque era uma empresa maior, que estava abrindo seu capital e que, portanto, agregaria para mim um valor profissional maior no futuro, além de nossos desafios.

O caminho que trilhei entre a Coteminas, Deloitte e a Medial me propiciou atuar junto à Controllers de grandes empresas, e pude analisar o que cada um deles tinha de melhor. Essa foi uma grande oportunidade de fazer benchmarking, e elaborar o meu próprio perfil como Controller, que aconteceu mais tarde no Porto.

Entrei na Porto Seguro como Gerente, passei para Superintendente, Diretor Estatutário de Controladoria, e agora estou como Vice-Presidente de Controladoria, Financeiro, Investimentos e Atuarial. Estou completando 18 anos de Porto, mas, posso afirmar com orgulho que trabalho todos os dias com a mesma curiosidade e entusiasmo do meu primeiro dia, mas, agora com muita paixão por esta Companhia.

O sucesso da minha carreira se mistura à ascensão da empresa

Entre tantas contribuições para o crescimento da Porto, a que tenho mais orgulho foi a mudança de cultura que iniciamos desde à minha chegada. Antigamente a empresa entendia a entrega de qualidade e preço como coisas praticamente antagônicas. Com esta nova cultura, trouxemos o foco para a jornada do cliente. Investimos na melhoria dos processos para ganhar produtividade, diminuir custo e aumentar a qualidade dos nossos serviços. Acreditamos que o cliente deve ter preço e qualidade ao mesmo tempo. Isso trouxe maior competitividade para a Porto. Mas tivemos que mudar também o mindset de muitos executivos da Porto, trazendo essa cultura da competitividade como um esforço contínuo, incessante, e que requer a atenção de todos. Afinal, o Controller em uma empresa com as dimensões da Porto não conquista algo sozinho. Somos o “fio condutor” de uma cultura, e guiamos toda a empresa rumo aos objetivos pretendidos. Mas precisamos que todos os colaboradores, em todas as frentes, estejam engajados com os objetivos da empresa. Isso só é possível quando criamos as KPIs corretas, fazendo com que todos os colaboradores passem a analisar a empresa, criando assim um exército de Controllers, claro que agradeço a meu CEO por toda a confiança e o apoio.

Mudar o mindset da empresa não é fácil, e não é algo que acontece em curto prazo. Minha carreira na Porto se junta à minha vida pessoal e à própria história da empresa. Ao longo da minha trajetória na Porto construí meu patrimônio, tive filhos, fiz inúmeros cursos, e me tornei o profissional que sou hoje. Neste mesmo período, a empresa se consolidou, teve ganho de produtividade, redução de custos e aumento da lucratividade. Ela também amadureceu, criou uma cultura moderna, focada na diversidade, na valorização do seu capital humano e na satisfação do cliente. Tenho orgulho em saber que contribuí para tomadas de decisões importantes, que levaram a empresa a este nível. Sempre tive uma relação de confiança com o Presidente e com todos os membros do conselho, algo que valorizo muito. Hoje, sinto-me parte da “alma” da empresa, e isso não há dinheiro que pague. Enfim, chegar aonde cheguei é a superação do meu sonho do início da carreira.

Uma carreira de sucesso está atrelada à uma forte ambição por conhecimento

Tento passar a mensagem aos meus filhos e à minha equipe que o sucesso da minha carreira se deve à minha infinita vontade de aprender. No decorrer da minha carreira nunca coloquei o status ou o dinheiro em primeiro lugar, mas sempre ambicionei oportunidades que me desafiassem intelectualmente. Meu sonho sempre foi de fazer parte do processo decisório das empresas, e assim ter um “peso” estratégico para elas. Aliás, mesmo quando eu jogava bola, buscava as posições em que pudesse decidir a jogada. Esse é o meu perfil.

O executivo que almeja uma carreira de sucesso não deve limitar-se às habilidades técnicas. Conhecer e investir em suas soft skills é fundamental. É justamente na busca por melhorias as quais as suas habilidades são menos favorecidas, em que se encontra o diferencial. E mais, atualmente é fundamental que o executivo pense de forma generalista, colocando as pessoas no centro de suas decisões.

Esse sentido de humanidade, preocupação com o colaborador e também do ponto de vista da honestidade, justiça e ética me foi passado pelo Jayme Garfinkel, da Porto. Até hoje, considero ele um grande mentor, que me inspira como ser humano e como líder.

Um bom líder desafia e inspira o profissional a entregar o seu melhor

Ser líder é cada dia mais difícil.  As novas gerações estão mais diversas em relação às suas escolhas de vida, e cabe ao líder, apenas, compreendê-las e integrá-las. Há profissionais que têm ambição de chegar a um cargo como o meu, por exemplo, e tem profissionais que querem trabalhar, fazer a sua parte, sem grandes ambições. Os primeiros estão prontos para sacrificar algumas horas de lazer ou de descanso para impulsionar sua carreira, os outros focam mais em sua qualidade de vida, buscando manter um equilíbrio entre a vida profissional e pessoal. Então, o líder tem que saber identificar e lidar com essas diferentes abordagens, valorizando cada um destes perfis.

Além disso, um bom líder tem que saber que a equipe precisa de diversidade de ideias, e essa diversidade vem da diversidade cultural, de classe, de gênero e étnica do seu grupo. Na Porto, eu sou o Sponser de um projeto Diversidade de Raça, o qual a gente trabalha ouvindo o que essas pessoas tem para falar e para contribuir.  Esse é um papel fundamental do líder, ouvir.

A celeridade é vilã em muitos sentidos

Durante os meus 39 anos de carreira, percebo que os executivos que tomam decisões visando um resultado imediato, sem ponderar em longo prazo as consequências financeiras e na imagem da empresa, correm um grande risco profissional. Eu, como executivo, sempre coloquei os interesses das empresas em que atuei em primeiro lugar, visando a sua perenidade. Nunca busquei resultados imediatos que me trouxessem algum ganho momentâneo e que de alguma forma fossem arriscados em médio ou longo prazos para as empresas. Quando o executivo pensa de forma madura, ele pode tomar decisões que comprometam os resultados em curto prazo, mas que asseguram um melhor retorno em médio e longo prazos, mas ao justificar estas decisões junto ao conselho de forma clara e coerente ele verá sua carreira deslanchar mais que arriscando-se em decisões imediatistas.

Neste sentido é importante pontuar que é muito comum ao jovem a ansiedade em querer alcançar os êxitos de uma carreira de sucesso de forma rápida, mas a verdade é que celeridade e sucesso “não andam de mãos dadas”. A conquista de uma carreira sólida é lenta e muitas vezes dolorosa. Nada que acontece muito rápido tem a profundidade necessária para ser duradoura. A profundidade traz consigo a aprendizagem, a experiência e o conhecimento, mas requer paciência. É muito comum aos jovens de hoje quererem mudar de emprego e de cargo a todo instante, mas esse imediatismo prejudica sua carreira, muitas vezes fazendo-os perder um tempo precioso. Ter objetivos claros em longo prazo auxilia o profissional a enxergar uma carreira de sucesso, e não apenas um cargo que lhe traga algum sucesso financeiro momentâneo. Contudo, encontrar uma carreira que traga propósito fará com que a cada projeto que este jovem se envolva, ele se dedique com afinco por vontade de crescimento e de desenvolvimento profissional. Dinheiro, cargo e sucesso virão como o reconhecimento natural do esforço empenhado. Tudo É possível, mas nada é fácil.

Ser uma pessoa que inspira pessoas

Este é o meu grande objetivo hoje. Continuar inspirando pessoas, ajudando meus pares, o CEO e o Conselho, a tomar decisões estratégicas importantes no curto, médio e, principalmente, no longo prazo. Meu desafio diário é ajudar a empresa a ser amanhã muito melhor que ela é hoje, admirada, e querida por todos, em que as pessoas venham trabalhar com prazer. Isso é um desafio e tanto: cuidar para que os 13 mil colaboradores da Porto tenham prazer em estar aqui.

Mas assim, como o Roberto me inspirou no passado, quero inspirar as pessoas que estão ao meu redor, e fazê-las saber que tudo é possível.

Leitura, um hábito essencial.

Indico como leitura obrigatória dois livros que me suscitaram insights e reflexões valiosas: “Factfulness” de Hans Roslingro e “A Mentalidade do Fundador” de Chris Zook e James Allen. Ambos valem a leitura.

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